Entrevista 2 anos atrás

Regionalização é o desafio no novo marco do saneamento

“O Jornal do Comércio publicou entrevista com Yves Besse, Presidente da Cristalina Saneamento, onde ele compartilha a sua visão sobre o desafio atual da regionalização para o avanço do saneamento no Brasil, entre outros assuntos. Confira a matéria na íntegra.”

Jefferson Klein

O novo marco regulatório do saneamento no Brasil instituiu o modelo de regionalização, possibilitando que os municípios se juntassem em blocos para contratar a prestação desse serviço através de alguma empresa do setor, como forma de ganhar escala e facilitar o cumprimento da meta de universalização do fornecimento de água e tratamento de esgoto até 2033. No entanto, o presidente da Cristalina e ex-presidente da Associação Brasileira dos Concessionários Privados dos Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), Yves Besse, considera conciliar os interesses das prefeituras e dos estados o passo mais difícil para a nova legislação. Apesar disso, Besse vê um enorme potencial nesse mercado, o que gerou a própria Cristalina, empresa com sede em Porto Alegre, criada no ano passado para atuar na formação de parcerias para a execução de projetos e na operação de serviços públicos para o setor de saneamento.

Empresas & Negócios – O que o novo marco do saneamento acrescentou ao setor?

Yves Besse – Ele veio para trazer alguns conceitos: planejamento, regulação, fiscalização, universalização e competição. Hoje, não existe mais a possibilidade de as companhias estaduais estabelecerem contratos sem licitação com os municípios. A única maneira de um município poder prestar o serviço sem licitação é ele mesmo fazer essa atividade, com uma autarquia municipal, mas se ele quiser delegar para um terceiro, seja uma empresa estadual ou privada, tem que passar por licitação. E capacidade econômico-financeira: quem está prestando serviço hoje, principalmente nessa transição do antigo para o novo marco, tem que demonstrar que tem capacidade para atender aos objetivos definidos pelo marco regulatório, que é 99% da população com água e 90% com esgoto até 2033.

E&N – A regionalização prevista dentro do marco de saneamento, com a possibilidade de um operador atender a blocos de municípios, será uma tarefa complexa de ser realizada?

Besse – A lei definiu que a regionalização seria um modelo mais adequado para levar mais rapidamente à universalização, por conta do ganho de escala. O governo federal determinou que os estados têm obrigação de estruturar um modelo de regionalização. Por outro lado, o marco regulatório diz que o município tem a prerrogativa de decidir se quer participar ou não do modelo de regionalização definido pelo estado. Isso já colocou uma discussão que tem que ser feita entre estados e municípios, que a gente sabe que nem sempre é fácil, porque entra política no meio. Eu diria que o ponto mais difícil do novo marco é justamente isso, a regionalização, que vai atrasar um pouco a definição de soluções.

E&N – Possíveis conflitos entre os municípios e as companhias estaduais que prestam o serviço de saneamento para essas cidades podem retardar as ações necessárias para atender às determinações do novo marco legal do setor?

Besse – Não tem dúvidas. Está acontecendo isso hoje, está tudo derrapando. Por quê? Porque está havendo uma discussão, complexa, justamente sobre essa relação estados e municípios. Para o estado continuar a prestar o serviço com a sua companhia, ele tem que se entender com o município, discutir uma revisão do seu contrato. A gente sentiu um posicionamento muito forte da Corsan (Companhia Riograndense de Saneamento) em relação aos municípios, querendo impor a adesão ao seu modelo. Das 317 cidades atendidas pela companhia, cerca de 70 aderiram (até meados de dezembro, 74 municípios gaúchos tinham firmado aditivos contratuais com a estatal de saneamento).

E&N – Qual a sua avaliação sobre o atual setor de saneamento ancorado no sistema de estatais?

Besse – O modelo em que as empresas estaduais atuam não funciona mais. É um modelo em que há uma ingerência política muito forte. Acaba acontecendo que se usa o saneamento para fazer política e não política para fazer saneamento, esse é o grande problema e o modelo tem que ser mudado.

E&N – Como foi criada a Cristalina?

Besse – A empresa surgiu no meio da pandemia, como um projeto que pudesse levar uma melhoria para a sociedade e foi eleita a área de saneamento, que tem tudo a ver com isso. Há muito interesse de investidores em entrarem nesse setor, mas não tinham uma plataforma para fazer isso. Então, se pensou por que não criar uma plataforma para sermos justamente esse veículo para que esses empreendedores pudessem investir no segmento de saneamento.

E&N – A forma de operação da companhia prevê a atuação com outros investidores?

Besse – É uma empresa que quer ser um veículo pelo qual os investidores ou outras companhias interessadas em entrarem no setor de saneamento possam desenvolver, junto com a gente, projetos nessa área. A gente se identifica como uma empresa integradora de parcerias, juntar forças com outras empresas, com investidores, para poder desenvolver projetos no campo do saneamento e basicamente projetos de concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs), ou seja, iniciativas com visão de médio e longo prazos e com volume importante de investimentos.

E&N – Quais serão os mercados-alvos da empresa?

Besse – Nosso foco é o Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. No Rio Grande do Sul, não somente porque os acionistas são daqui (o gaúcho e ex-secretário de desburocratização do Ministério da Economia, Paulo Uebel, é um dos fundadores da Cristalina), mas porque o Estado tem uma necessidade enorme de investimentos em saneamento. O Rio Grande do Sul tem um saneamento com um nível semelhante ao do Norte e Nordeste, enquanto a condição socioeconômica da população é muito mais elevada. E, provavelmente, por essa condição socioeconômica superior, se tem um nível tarifário mais alto no Rio Grande do Sul e Santa Catarina do que no Norte e Nordeste.

E&N – O que consta no plano de negócios futuros da Cristalina?

Besse – Tentar conquistar, aproximadamente, dez contratos em cinco anos. E obviamente esses contratos, por serem de capital intensivo, vão necessitar de muito investimento, na ordem de R$ 5 bilhões, em dez anos. E a partir desses dez contratos imaginamos atender à cerca de 1 milhão a 1,5 milhão de pessoas. Isso é uma estimativa, simulações que fizemos e tudo é reavaliado todo ano. Imaginamos que vamos conseguir ter os primeiros contratos a partir de 2023.

E&N – A Cristalina tem interesse no processo de IPO (oferta pública inicial) da Corsan?

Besse – Está dentro do nosso business. Quando a gente fala que queremos ser um integrador de parcerias, a ideia é integrar investidores para investir no saneamento. No caso da Corsan, a gente poderá ser o integrador e ajudar o investidor a avaliar o valor desse ativo e mostrar que há uma atratividade e, junto com ele, auxiliá-lo a participar desse ativo e depois da gestão da companhia. Não somos os investidores, somos aqueles que vão propiciar ao investidor a entrar no setor pelo conhecimento que temos do tema. Somos especialistas e podemos ajudar que empreendedores tenham tranquilidade nesse investimento. Nós seríamos gestores. Se cria um fundo e a empresa entra como gestora do fundo na compra das ações da Corsan.

E&N – Já teve algum empreendedor que tratou com a Cristalina manifestando interesse no IPO da Corsan?

Besse – Estamos conversando. Estamos trabalhando e percebemos interesse de investidores do Rio Grande do Sul em estar junto com a gente.

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